Mesmo após 135 anos da abolição da escravatura no Brasil, ainda são encontrados casos de trabalho em condição análoga à escravidão. Um exemplo foi registrado essa semana, envolvendo mais de 200 trabalhadores de uma empresa que oferecia a mão de obra para vinícolas do Rio Grande do Sul. Em 2022, foram encontrados 437 trabalhadores no Nordeste nessa situação.
Os dados, coletados pela Agência Tatu, são do Radar SIT (Secretaria de Inspeção de Trabalho), o Painel de Informações e Estatísticas da Inspeção do Trabalho no Brasil, e apontam que os casos correspondem a quase 17% de todos os registrados no país.
Trabalhadores encontrados em situação análoga à de escravo em 2022
É tipificado como trabalho análogo à escravidão situações que submetem um trabalhador ou um grupo a uma condição degradante, trabalhos forçados, jornada exaustiva, restrição de locomoção – seja por dívida contraída ou qualquer outro motivo que tenha a finalidade de retê-lo no local de trabalho, retenção de documentos e objetos pessoais e vigilância ostensiva.
De acordo com o auditor-chefe do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em Alagoas, César dos Santos Fontoura Marques, os casos podem ocorrer tanto no meio rural quanto urbano.
“Existem agora versões de trabalho análogo ao de escravo na cidade, o que era difícil acontecer e tem acontecido frequentemente” – César Fontoura, auditor chefe do MPE em Alagoas.
Ao receber a denúncia, os fiscais do MTE possuem a competência para resgatar e libertar os trabalhadores da condição de escravidão. No resgate, também podem participar da operação o Ministério Público do Trabalho, Polícia Federal, Polícia Ambiental, entre outros, já que é comum haver denúncias de outros crimes além do trabalho escravo.
“A gente leva [o trabalhador] para um local seguro, um abrigo, e o empregador tem que pagar todas as verbas, por exemplo, FGTS atrasado, INSS, férias, essas jornadas exaustivas e outras multas, como férias vencidas há mais de dois anos. Essa é a primeira punição, que é a administrativa”, diz o auditor-chefe César Fontoura.
A segunda punição é a de caráter penal. “O Artigo 149 do Código Penal diz que o empregador pode pegar de 2 a 8 anos de prisão. Ele também é investigado pela Polícia Federal, porque é um crime contra a organização do trabalho e essa pena pode aumentar, dependendo das circunstâncias que estiverem [os trabalhadores] ali naquele ambiente”, afirma César.
Segundo a plataforma Radar SIT, em 2022 houve o registro de 2.575 trabalhadores encontrados em situação análoga à de escravo. No entanto, esse número pode ser ainda maior, já que a plataforma não apresenta registros do Amapá, Amazonas e Alagoas neste período.
O que pode explicar a falta de dados nos três estados é o trâmite do processo de Autos de Infração, relatório técnico e outros documentos que demoram para serem concluídos, devido ao fato de que é necessário dar ampla defesa aos envolvidos, conforme explicação do auditor-chefe do MTE em Alagoas. César Fontoura também afirmou que é possível que os dados sejam atualizados em breve.
Como denunciar
Para denunciar um caso de trabalho análogo ao de escravo basta ligar para o Disque 100, canal de denúncias de violações de direitos humanos. Também é possível denunciar acessando o portal do “Sistema Ipê” e formalizando o registro, que também pode ser feito de forma anônima, fornecendo a maior quantidade de informações e detalhes possíveis, para que a fiscalização do trabalho possa analisar os indicadores e promover as verificações no local indicado.